quarta-feira, 1 de abril de 2009

Reflexões sobre a Via Crucis (X)

Quando o Senhor chega ao Calvário, dão-Lhe de beber um pouco de vinho misturado com fel, como um narcótico que diminua em parte a dor da crucifixão. Mas Jesus, tendo-o provado, para agradecer esse piedoso serviço, não quis bebê-lo (cf. Mt 27, 34). Entrega-se à morte com a plena liberdade do Amor. Depois, os soldados despojam Cristo de suas vestes.

"Desde a planta dos pés até o alto da cabeça, não há nele nada são; tudo é uma ferida, inchaços, chagas podres, nem tratadas, nem vendadas, nem suavizadas com óleo" (Is 1, 6).

Os algozes tomam as suas vestes e as dividem em quatro partes. Mas a túnica não tem costura, e por isso dizem:

"— Não a dividamos, mas lancemos sortes para ver de quem será" (Jo 19, 24). Deste modo voltou a cumprir-se a Escritura: "Repartiram entre si as minhas vestes e lançaram sortes sobre a minha túnica" (Sl 21, 19).

É o despojamento, é a pobreza mais absoluta. Nada restou ao Senhor, a não ser um madeiro. Para chegar a Deus, Cristo é o caminho. Mas Cristo está na Cruz; e, para subir à Cruz, é preciso ter o coração livre, desprendido das coisas da terra... Do tribunal ao Calvário, choveram sobre Jesus os insultos da plebe enlouquecida, o rigor dos soldados, as zombarias do Sinédrio... Escárnios e blasfêmias... Nem uma queixa, nem uma palavra de protesto. Nem mesmo quando Lhe arrancaram da pele as vestes. Aqui compreendo a minha insensatez ao desculpar-me. Propósito firme: trabalhar e sofrer pelo meu Senhor, em silêncio.

O corpo chagado de Jesus é verdadeiramente um receptáculo de dores... Por contraste, vem-me à memória tanto comodismo, tanto capricho, tanto desleixo, tanta mesquinhez... e essa falsa compaixão com que trato a minha carne... Senhor! Por tua Paixão e por tua Cruz, dá-me forças para viver a mortificação dos sentidos e arrancar tudo o que me afaste de Ti.

A ti, que te desmoralizas, vou-te repetir uma coisa muito consoladora: a quem faz o que pode, Deus não lhe nega a sua graça. Nosso Senhor é Pai, e, se um filho Lhe diz na quietude de seu coração: "Meu Pai do Céu, aqui estou eu, ajuda-me...", se recorre à Mãe de Deus, que é Mãe nossa, vai para a frente. Mas Deus é exigente. Pede amor de verdade; não quer traidores. É preciso que sejamos fiéis nessa peleja sobrenatural, que é sermos felizes na terra à força de sacrifício. Os verdadeiros obstáculos que nos separam de Cristo — a soberba, a sensualidade, o egoísmo, etc... — superam-se com oração e penitência. E rezar e mortificar-se é também ocupar-se dos outros e esquecer-se de si mesmo. Se vives assim, verás como a maior parte dos contratempos que tens, desaparecem...

Quando lutamos por ser verdadeiramente como Cristo, então o humano se entrelaça com o divino na nossa própria vida. Todos os nossos esforços — mesmo os mais insignificantes — adquirem um alcance eterno, porque se unem ao sacrifício de Jesus na Cruz...

Adaptado do livro "Via Crucis", São Josemaría Escrivá.

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